Crítica - Bakuman: Live-Action(2015).

Bakuman/ sem tradução, dirigido por Hitoshi Ohne.
Muitos reclamam da má qualidade de adaptações cinematográficas derivadas de games, mas há um nicho ainda mais prejudicado: o de mangás. São poucos os live-actions que surgem quando pensamos em bons filmes baseados nas HQ's orientais. A trilogia de Samurai X, Battle Royale. Se for generoso, pode-se citar Ao Haru Ride, Kimi ni Todoke, Orange, mas ainda assim, o contraponto é gritante. Death Note (os japoneses mesmo, ainda que o americano seja potencial candidato à lista), Another, Gantz, Speed Racer e o pavoroso Dragon Ball Evolution, todas atrocidades que em nada lembram a qualidade de seus originais homônimos.

Com um histórico tão ruim, o prognóstico para Bakuman não poderia ser animador. Um filme com cerca de duas horas tentar adaptar um mangá de 176 capítulos é arriscado e com grandes chances de criar lacunas para acelerar a narrativa e focar em pontos capitais. Contra todas essas possibilidades, é surpreendente que o Live-Action da história dos dois mangakás adolescentes seja realmente um bom filme. Leve e despretensioso, mas competente em sua abordagem, e ainda com boas doses de fanservice não forçadas.

Inspirado na obra de Obata Takeshi e Ohba Tsugumi (Death Note, Platinum End), a trama acompanha Moritaka Mashiro - o desenhista - e Akito Takagi - roteirista -, dois estudantes de ensino médio que se juntam para tentar a sorte como mangakás da Shonen Jump (SJ), maior revista do gênero e com publicação semanal. 
Mangá x LA

O sonho dos garotos é, estritamente, ingressar na concorrida lista de autores serializados da SJ, como se outras editoras e revistas inexistissem no universo do filme, e isso, é claro, serve como propaganda para a própria. O início do longa enaltece os números exorbitantes da publicação, com seus vários recordes e obras mais conceituadas, como Dragon Ball, Death Note, One Piece, Naruto, Hunter x Hunter, Cavaleiros do Zodiáco e tantos outros. Números que a colocam no topo da lista das revistas de quadrinhos mais vendidas do mundo, segundo o filme.

Com um começo desses, a imagem inicial é que veremos 120 minutos utópicos que buscam apenas celebrizar o sistema de mangás japonês, ressaltando o lado positivo e apresentando os profissionais de uma indústria notoriamente predatória e abusiva como caricaturas irreais sempre preocupadas com o bem-estar dos empregados acima de ganhos monetários. 

O que vemos, entretanto, é bem diferente. Não, Bakuman não é um drama que critica e acusa as editoras de serem ditatoriais ou expõe toda sua estrutura como algo podre, mas não se omite em discutir os dois lados de quem ganha a vida por este meio. 

Recentemente, em um evento da JBC, Nihei Tsutomu, autor do mangá Sidonia no Kishi (Knighs of Sidonia), ao ser questionado se encorajaria um brasileiro a se tornar mangaká, respondeu "não". Foi em tom de brincadeira, é claro, mas não há um tom de verdade por trás disso?! Assim como no mundo do futebol, uma elite acaba por obscurecer a realidade da profissão, o lado não glamouroso, por assim dizer. Em meio a Akira Toriyamas e Eiichiro Odas, há vários jovens que se frustram e nunca conseguem atingir reconhecimento e sucesso por seus esforços, e mesmo entre aqueles que se destacam, continuar no topo exige uma dedicação descomunal para atingir metas e manter a história em um bom nível, principalmente para iniciantes (Yoshihiro Togashi obviamente não se encaixa na comparação).

E o sucesso pode ser efêmero, como o que aconteceu com Taro Kawagushi, tio de Mashito e que serve de inspiração para o garoto. Após anos entre os top sellers da SJ, com o repentino decréscimo de popularidade de Bakuman (obra de Taro), este é despedido prontamente, a despeito dos anos de serviço. 

Normalmente, o que leva alguém a buscar tornar-se um mangaká é, obviamente, um sonho que cresce no ínfimo dos indivíduos de acordo com a vida que este leva. Mas o público comum vê apenas o resultado de todo um processo, não tendo ideia de tudo que ocorreu até lá, e este caminho é tudo menos uma utopia de adquirir o sustento através de um emprego tido como "diferente", e logo, com a ideia de ser algo muito mais fantástico do que realmente é. 
Ambos inocentes e pequenos perante a indústria.
O mundo dos mangás é uma indústria, e como tal, é movimentada por dinheiro e pessoas, e não há arte sem concorrência e muitos, muitos obstáculos.

Nessa indústria "dos sonhos", deve-se conviver com o constante fantasma da desvalorização repentina que afeta não apenas os veteranos, como também os iniciantes - e por iniciantes, não me refiro apenas aos jovens, com também adultos que buscam uma chance de lançar seu trabalho. A disputa interna entre autores e até editores, a sobrecarga de trabalho imposta para lançar o capítulo em tempo, comprometendo a saúde dos envolvidos, a aparente insensibilidade dos chefões para seus subordinados, a cruel realidade daqueles que já estão em uma idade qual deveriam estar estabelecidos na vida, mas ainda buscam a oportunidade certa.

São todos aspectos discutidos no filme. Não é um mundo justo, assim como ocorre em qualquer empresa e ramo mercadológico. Mas também há o lado bom para aqueles que tiverem uma mescla de sorte com competência e talento.

Mashiro e Takagi, apesar de todos os percalços, amam o que fazem, como pode ser visto pelo bom design de produção, que preenche o escritório dos dois com mangás, como se vivessem emersos nisso. Eles têm seu produto recusado mais de uma vez, mas persistem até atingirem um resultado melhor o suficiente para publicação. Takeru Satoh e Ryunosuke Kamiki se saem bem, e mesmo com com idades bem avançadas em relação a estudantes de ensino médio, ambos conseguem tornar crível a paixão dos garotos pela arte, como o sorriso e brilho nos olhos ao irem conquistando objetivos e seu esforço recompensado.
A estupefação de ver seu trabalho reconhecido.
A química entre os dois é ótima, assim como a relação da dupla com os mangakás rivais. Ainda que exista concorrência, ela não cai no maniqueismo, sendo muito mais uma disputada estimulante - tipo Messi e Cristiano Ronaldo -, e sob o lema "esforço, amizade e vitória" da Jump, todos os autores, de idades e personalidades distintas, ligados pelo elo de serem aspirantes em busca de reconhecimento, se auxiliam mutuamente. 

Uma pena que o mesmo não pode ser dito no que tange a ligação de Mashiro com Miho Azuki. O maior defeito de Ohba e Obata é justamente a dificuldade de criar personagens femininas forte, e o filme acaba por possuir o mesmo problema. A promessa envolvendo os dois é repentina e sem construção, os próprios atores pouco trocam momentos juntos, o que torna difícil crer que haja sentimento para o juramento que fazem. Não há empatia na garota, pois Nana Komatsu não ganha tempo para trabalhar a personagem com um roteiro tão vago, fadando-a a emitir sorrisos despropositados. É a maior falha que o apressado roteiro comete para adequar tanto conteúdo em pouco tempo.

Apesar de tudo, nesta péssima safra, Bakuman é eficiente em satisfazer a nação Otaku, urgentemente necessitada de boas versões live-action de animes e mangás, assim como pode facilmente agradar àqueles não familiarizados com o entretenimento nipônico. O panorama continua negativo, mas ainda há esperança.

Nota: 8.

Um comentário:

  1. Achei bem ruim essa Live action, mesmo tentando evitar as comparações com o mangá. A trama estava mal feita, modificaram a personalidade de alguns personagens, o romance (que é muito simpatizante no mangá de bakuman) estava deplorável, sem dizer que o nizuma-kun (único ator que pegou a essência do personagem) é visto como um inimigo nesta live action. Como fan do mangá de bakuman foi decepcionante :\

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