Crítica - A Colina Escarlate(2015).

A Colina Escarlate(Crimson Peak), dirigido por Guillermo del Toro.
 Guillermo del Toro já explorou vários gêneros cinematográficos, alguns com resultados mais satisfatório do que outros. Mas fato é que grande parte de suas obras(com exceção a Pacific Rim) possuem uma semelhança estética, principalmente quando mistura o horror com fantasia e drama, . Dessa combinação, saiu "O Labirinto do Fauno", certamente seu maior triunfo profissional, e agora, com Crimson Peak, o diretor volta a utilizar dos artifícios que mais domina. Seu novo filme parece uma combinação de Fauno, com um tom de fábula, com "A Espinha do Diabo", um de seus primeiros longas. A assinatura de del Toro é tão peculiar, que Crimson lembra, inclusive, fitas produzidas por este, como "Mama"(as partes boas) e "O Orfanato". O resultado ainda não se assemelha ao seu auge, mas certamente possui seus méritos na criatividade do cineasta.

O enredo se desenrola a partir de Edith Cushing(Mia Wasikowska), uma aspirante a escritora e herdeira da fortuna de seu pai(Jim Beaver) que se apaixona por Thomas Sharpe(Tom Hiddleston), indo morar com este na Colina Escarlate, onde também reside Lucille Sharpe(Jessica Chastain), irmã de Thomas. Chegando lá, aparições e fatos sombrios começam a assolar Edith, botando em duvida se fez a escolha certa ao abandonar tudo por amor.

Espectadores mais desavisados certamente não vão receber o que esperam no cinema. Vendido erroneamente como uma obra de terror, o marketing acaba se auto-sabotando, sendo que o próprio Guillermo, em seu twitter, o define como "Um romance gótico". E é isso que apresenta, utilizando suas supracitadas especialidades ao mesclar gêneros com seu talento em contar histórias. O terror está presente, sim, mas é apenas uma das camadas que dão corpo a película.

"Fantasmas são reais", entoa Edith logo na primeira cena de Crimson, e realmente são, neste universo. Mas o horror do filme está muito mais presente intrinsecamente na atmosfera criada pelo mexicano, utilizando as assombrações não tanto para assustar, e sim com relevância para a trama. O design das aparições, apesar de interessante, lembrando muito as da franquia Silent Hill, de nada funcionariam sem o plano de fundo montado por del Toro e sua equipe, esses sim, as principais qualidades do longa.

O design de produção salienta bem a dicotomia entre os dois principais ambientes mostrados: a moradia dos Cushing, em Nova York, e a mansão dos Sharper, na Inglaterra. A 1ª é mostrada calorosa e acolhedora, com Mia quase sempre filmada em ângulos claros ou iluminados, literalmente em casa, como o espírito da jovem. Já transportada para Inglaterra, ela se vê presa em um local que outrora já fora imponente e grandiosa, mas certamente longe de seus melhores dias. A ambientação britânica é decadente, mórbida, fria, suja, quase inóspita, ressaltada por só vermos neve ao redor da mansão, causando o sentimento de solidão. São dois contrapontos, assim como as situações enfrentadas pela protagonista quando troca de continente.
Frio, isolado e macabro. Essa é a localidade dos Sharpers.


Junto com o design de produção, há o figurino, combinando um com o outro em perfeita sincronia. Mia vive usando vestidos de cores claras e vivas, destacando sua personalidade forte, ambiciosa e cordial. Já Thomas, é visto sempre usando cores frias e sombrias, em contraste a sua personalidade bondosa e solícita. Jessica Chastain, entretanto, é que mais recebe uma boa utilização de vestimentas. Inicialmente mostrada como alguém recatada e silenciosa, suas roupas, em vermelho sangue, mostram o que o rosto impassível não expressa enquanto inconveniente. A personagem é ardilosa e inescrupulosa desde o começo, mas não de forma expositiva. O bom cinema é isso, utilização de todos seus recursos de forma útil e inteligente.

Mas do que adiantariam figurino e design de produção excelentes sem bons atores?! Felizmente, aqui temos todos em harmonia. Mia Yakissoba Wasikowska, uma atriz que após surgir na 7ª arte de forma insossa, entrou em plena evolução, entregando boas atuações como em "Segredos de Sangue", "Amantes Eternos" e "Mapa para as Estrelas". Seu trabalho em Crimson certamente entra para o hall positivo de sua carreira, entregando uma Edith batalhadora, inteligente e carismática, assim como consegue passar sua fragilidade quando necessária. O destaque, porém, fica com os Sharpers. Tom Hiddleston, que ator! Jorrando toda sua presença a partir do primeiro momento em que aparece, o britânico, com seu carisma e charme, nos comove como um baronete que precisa desesperadamente de dinheiro para reerguer o nome de sua família, assim como torna plausível a escolha de Mia de ir consigo para Inglaterra, tudo isso ainda exalando uma certa malícia e mistério. Jessica Chastain, que a cada trabalho surpreende com sua versatilidade, constrói sua Lucille em várias nuances. Surgindo como alguém dócil e de poucas palavras(algo contraposto a seu figurino, como já dito), a atriz consegue, em poucos segundos, alterar completamente a personalidade da personagem, ora parecendo uma calma e altruísta anfitriã, ora soando intimamente letal e perigosa. Vale destacar o trabalho da ruiva por detalhes, pois são estes que conquistam e corroboram o talento de Jessica. Seus olhares e trejeitos, o leve tremor dos lábios quando tenta conter emoções mais fortes, tudo isso fornece credibilidade a sua interpretação. Os irmãos lembram muito vampiros - como estes realmente são.
Tom Hiddleston e Jessica Chastan, dois dos melhores atores da atualidade.


Quanto os coadjuvantes, o veterano Jim Beaver, mesmo com pouco tempo em tela, consegue mostrar todo seu amor por Edith, sua filha, tornando suas preocupações naturais e verossímeis. Charlie Hunnan, por outro lado, é o personagem menos interessante e complexo, sendo desenvolvido de maneira preguiçosa e pragmática. Logo em sua primeira fala é possível prever que estamos diante do mocinho. Falta tridimensionalidade, algo indispensável para gerar empatia, o que passa longe de ocorrer, o que gera uma sensação de indiferença para com seu destino.

Entre erros e acertos, Guillermo ainda é confiante e esperto o suficiente para não subestimar o espectador através de métodos clichês e óbvios visando surpreender o público. Tirando um ou outro deslize, raramente a trilha sonora é erguida de forma repentina. Todo o conjunto da obra é suficiente para trazer à tona reações e emoções do público.

Infelizmente,  uma de suas maiores qualidades, acaba sendo o grande defeito de Colina Escarlate. Se a transição de gêneros convence nos 2 primeiros atos, no 3º, aqui e ali, perde força, e a falta de um foco narrativo acaba cansando. A tentativa de igualar o tempo em tela entre os fantasmas, os personagens e a série de revelações, acaba ficando abrupta e corrida. Por vezes, inclusive, temos um lado trash. O diretor pecou por seu excesso de ideias, ávido por mostrar todas elas em 2 horas de projeção.

A expectativa que temos do cineasta entregar uma obra tão boa quanto o Fauno, de longínquos 9 anos atrás, ainda não foi saciada. mas isso não deve prejudicar Crimson Peak, que é sim um bom filme, e deve ser apreciado como tal.

Nota: 7.

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