Crítica - Alien: Covenant (2017).
Que Ridley Scott é um diretor de grandes virtudes e já agraciado com a benção de memória perene, ninguém duvida. Ainda que tenha assumido um caráter claudicante nesta década, a destreza com que trafega em ritmo industrial por blockbusters enormes reforça sua segurança por trás das câmeras. E mesmo em suas empreitadas duvidosas, as mãos experientes costumam garantir alguma qualidade no que poderia soar medíocre com nomes menos versados.
Dito isto, não deixa de ser lamentável que seu retorno ao universo que o apresentou ao mundo seja, assim como fora em Prometheus, desequilibrado e indigno da genialidade do original, ainda que possua alguns méritos esporádicos e que garantem, ao final, ao menos um sorriso de leve aprovação.
Passados 10 anos dos acontecimentos vistos em Prometheus, a nave colonizadora Covenant, ao receber um sinal misterioso de determinado planeta, resolve divergir de seu curso original para averiguar o remetente, e aí, como diz a leia da narrativa pelos tempos e plataformas, é onde reside o perigo. Tal qual vimos em alguns capítulos anteriores da franquia, é na curiosidade que surge a desgraça.
Uma repetição de fórmula, sim. Como se esta fosse a única imaginação possível para instaurar o vindouro caos que sempre nos aguarda nos títulos de Alien, um mal que acomete basicamente todos os roteiristas contratados. Mas é um clichê que perdoamos pela cumplicidade na dúvida. Ao menos a justificativa, naturalmente frágil, ganha plausibilidade na figura do igualmente tênue capitão Oram (Billy Crudup), visto desde o primeiro momento incapaz de emitir suas ordens sem tremelicar o mandibular ou gaguejar as palavras, claramente desconfortável no cargo imposto por questões trágicas.
Se fosse uma conveniência unitária, então, passaria facilmente batida. Mas não. Mesmo que Alien 3 e 4 sejam unanimemente ignorados na cronologia espacial criada por Scott, sua existência contamina, de modo paulatino e intermitente, as sequências desta década. A banalização da morte para a criação do mito da protagonista. É um blasé típico do gênero terror, mas elevado às massas nos supracitados longas. Com exceção de 3 nomes, toda a tripulação é retratada com o carinho e atenção de pedaços de carne, enquanto vidas se esvaem e corpos se empilham como um saco de presuntos no açougue, um velho e manjado artifício para construir o pânico da situação. Difícil não interpretar isto como preguiça, visto que em tantos anos de cinema qualquer profissional minimamente capacitado possui conhecimento de que mortes de indivíduos que não nos importamos e não conhecemos não causam o abalo necessário para a imersão diegética. É como as metrópoles destruídas pelos Vingadores.
Se reciclagem foi uma das mais prementes críticas a Star Wars VII, é fácil prever que o mesmo ocorrerá em Covenant - e em doses cavalares. Aos fãs estelares, resta o consolo de que Abrams reutilizou conceitos de sucesso. Aqui, temos um amálgama confuso e manco entre os melhores e piores elementos que vimos desde Oitavo Passageiro ao próprio Prometheus.
Se reciclagem foi uma das mais prementes críticas a Star Wars VII, é fácil prever que o mesmo ocorrerá em Covenant - e em doses cavalares. Aos fãs estelares, resta o consolo de que Abrams reutilizou conceitos de sucesso. Aqui, temos um amálgama confuso e manco entre os melhores e piores elementos que vimos desde Oitavo Passageiro ao próprio Prometheus.
Entretanto, faça-se justiça e uma ligação ao parágrafo inicial, Ridley Scott não perde a mão e não é agora que a idade o atinge. Tranquilo e sereno nos milhões torrados, retoma as origens com soberba e inteligência nas cenas que exigem uma sensação de urgência e alarme, mesmo que o resultado seja óbvio. E é nítido os benefícios de tantas décadas no serviço, pois mesmo encarregado de tamanha megalomania do mundo moderno que é a película, sua direção é leve e fluida o suficiente para não chamar atenção desnecessária e assimilar-se ao terreno como se definitivamente fizéssemos parte da jornada da Covenant e suas - várias - intempéries de nível sempre preocupante pela desolação do espaço - relembrem aqui a frase que estampava os pôsteres do primeiro Alien: "No espaço, ninguém pode ouvir você gritar".
Claramente retratando sobrevivência como status de força, surge a heroína da vez, Katherine Waterston, a saltar degraus amalucadamente desde sua descoberta por Paul Thomas Anderson, em Inherent Vice(2014). A atriz carrega uma aura diferenciada de carisma e talento, mas novamente temos aqui a preguiça do roteiro, e seus esforços são insuficientes para evitar de transformar sua Daniels em uma réplica de Ripley.
Com tantos atores de estepe, (e esperem só para ver a atuação de James Franco) Michael Fassbender honra a tradição iniciada com Ian Holm e faz deste novo Alien um nababesco palco para seu impecável show solo - ou em dueto, se preferir. Sem medo de hiperbolizar, já se prontifica para as listas de melhores double-actings da história da sétima arte, e não seria absurdo se um desinformado realmente acreditasse que David e Walter tratam-se devidamente de atores gêmeos, e não um só, tamanha a individualidade conferida pelo ator. E é sua intensidade que torna aceitável o mais previsível dos twists, quando ansiamos tanto pela reação do androide - sintético, como ele mesmo diz - que a obviedade a artificialidade da reviravolta fica em segundo plano.
Fassbender é o peso que pende a favor do respeitável uma trama debilitada e questionável que se mantém unicamente pelos dois dínamos envolvidos - o ator, e é claro, Scott.
Por enquanto é suficiente, mas a longevidade prega por um esmero mais abrangente e dinâmico. E o xenomorfo, uma das criações mais monstruosamente fascinantes do cinema, merece uma história devida.
Aguardamos a próxima missão.
Nota 7.
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