A Era de Taylor Swift: Crítica do The Eras Tour

Me deparei com um estudo recente, em que dos entrevistados, 80% responderam que música e eventos ao vivo afetam positivamente o bem-estar geral e o humor. A artista mais citada para tais efeitos foi Taylor Swift, com 32%. Vivendo no apogeu de seu sucesso, comparado até com o estrondo de Michael Jackson em seu ápice, a loirinha de 33 anos se tornou um fenômeno multimídia e disputada por tudo e por todos. E ouvida, apreciada por todos os públicos. Uma situação rara. Em meio a uma turnê histórica, englobando toda sua discografia após uma reformulação devido a disputa de direitos e uma pandemia que impossibilitou concertos de seus últimos álbuns, é um passo natural transformar tal evento em um filme, facilitando o acesso a todos (afinal, além da questão financeira, a disponibilidade dos ingressos tem tornado sua busca ferrenha) e causando um furor tanto em bilheteria quanto no comportamento de fãs, transformando salas de cinema em pistas de shows.

Conferir o espetáculo numa tela grande (tive o privilégio de o fazer em IMAX) atesta bem tanto o poder que a artista centraliza hoje com milhões de pessoas, quanto o estado emocional que ela consegue influenciar sem precedentes. A criação de um fenômeno popular sempre vai entrar na discussão entre a qualidade de tal nome em cotejo com seu alcance. Afinal, ainda mais quando falamos de pop, é comum que se subestime e até ridicularize nomes de "divas pop" como baixa complexidade de seu material, tido como barato, superficial ou momentâneo. Se Taylor já sofreu com tal alcunha, muito de tal preconceito foi desarmado, especialmente na pandemia, quando lançou dois álbuns de sonoridade, letras e produção bastante autorais, alternativas e pessoais, sem adotar um estilo genérico de muitos grupos e que tendem a defasar artistas sem personalidade e voz. As Taylor Version vieram para confirmar de vez Taylor como a própria autora, um nome e uma artista, não somente a voz e o carisma - que os tenha também serve para este catalisador estratosférico ao status que atingiu. 

No erro e no acerto, no pop e na reflexão, é seu caráter, suas ideias, sua figura que esta expressa naquelas letras e melodias, não somente uma reverberação vazia para engajamento. Quando Taylor emerge no palco do SoFi Stadium para histeria coletiva de 70 mil vozes da plateia, ela já entra com o controle total de todos ao seu redor, embalados por uma mistura de pirotecnia técnica e estimulação incessante dos corpos de apoio no palco, em voz e coreografia. Taylor nunca esta sozinha, mas sempre centralizada. 

A distribuição do setlist seria até acessório perante tal poder de atração que ela emana. É como se, no momento de seus concertos, o epicentro terrestre fosse onde Taylor pisa. Cada movimento coreográfico, troca de figurino, acenos, piscadelas ou insinuações sensuais invocam, calculada ou genuinamente, um pandemônio ao redor, independente da letra do momento. Aliás, num repertório com mais de 40 canções e um show que ultrapassa as 3 horas, não há cansaço e esgotamento que parece minar o êxtase de tanta gente, que provavelmente já aguardaram outras tantas horas em fila e/ou viagens. 

Visualizar, entretanto, tanto a produção do espetáculo quanto a encenação de Taylor neste é a assombrosa evidência de um vulcão em erupção, como poucos nomes já o fizeram. Perpassando por tantas eras, o equilíbrio entre o pop grudento e dançante com baladas pessoais e melancólicas distribui o tom e controla a atmosfera sem esgotar, assim como também dão algum vislumbre do poder de composição de Taylor em transformar em poesia e catarse suas emoções e sentimentos, de um aniversário a uma memória dolorida; de um amor não correspondido a paranoias mentais da madrugada. Taylor não afasta o ouvinte com melodias e palavras distantes e imediatas, mas provoca a empatia, na vingança ou na introspecção, a compaixão e, abrangendo tudo isso, a relação visceral com o que ela ali diz. 

Talvez nenhuma indústria seja tão impiedosa quanto a musical. Um erro de cálculo, mesmo fora de seus álbuns, pode levar ao cancelamento, à obsolescência. Não faltam grupos e nomes que caíram em ostracismo após alguns singles que sustentam uma fama decadente e miserável. Ao domar suas emoções e abrir seu peito, Taylor garante a atemporalidade, mesmo que o sucesso vá, naturalmente, definhar e dar lugar a novas gerações em algum ponto. 

A The Eras Tour assim se chama por, como supracitado, unir vários de seus álbuns. Mas a era, de verdade, é a da própria Taylor. Acima de tudo, um símbolo, um marco no zeitgeist a qual está inserida. 

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