Vida Selvagem (2018) - Crítica
Em certo momento de Wildlife, Joe, filho de Jeanette e Jerry, contempla, impotente, um colérico incêndio florestal que varre a montanha à sua frente. Filmado de costas, toda sua fragilidade e inoperância é destacada perante a brutalidade das chamas, que transformam em cinza toda a vida e beleza da paisagem.
"Você gosta?", pede a mãe. Ele acena que não, num olhar compenetrado de quem rapidamente associou a fúria destruidora do fogo ao casamento de seus pais. Não em vão, afinal, foi Jean que o levou ali, sozinhos, pois o pai se ausenta justamente num emprego tapa-buraco para combater os incêndios da região.
Tanto quanto as árvores e folhas que são obliteradas pelas labaredas, a relação de Jerrie e Jeanette se deteriora a cada plano e sequência do filme. Mesmo nos momentos calorosos, são retratados com uma intimidade constrangida e artificial, como se encenassem automaticamente os papéis de marido e esposa que se habituaram com o tempo. Sem o sentimento verdadeiro da paixão.
Sua modesta casa emana a busca pela simplicidade e monotonia, com um filtro amarelo anêmico e apático, tão pouco natural quanto os abraços e diálogos dos dois. Tentam se misturar ao ambiente, mas como família, jamais encontram a unidade. Perdido em meio ao afastamento irreparável dos pais, Joe, o terceiro Jota do espaço, observa com olhos nervosos a relação de ambos. Ele sabe muito mais do que nós de que algo não vai bem. Inteligente que é, deve ter concluído que é ele o elo que mantém os personagens de Jake Gyllenhaal e Carey Mulligan unidos, comprometidos na criação saudável do filho, em busca da confirmação do American Way. Eles querem se amar, tentam se convencer disto. Mas é uma faxada.
Os três, de fato, se encontram deslocados. É desolador o olhar desesperado de Joe ao buscar entender o que se passa. É a incapacidade de reatar a ligação familiar. É um jovem que pela primeira vez tem de dar as respostas, e não recebê-las daqueles quais foi acostumado a confiar e acreditar saberem tudo. É o terrível período de descobrir que seus pais não são heróis, e carregam tantas imperfeições e dúvidas quanto ele, na iminência do primeiro amor.
Por que Jerrie, vivido por Jake, não aceita o antigo trabalho de volta e permanece com a família? Por que a mãe não se contenta mais com seu marido? O que ela faz com outro homem? Tão inseguros e frágeis quanto o adolescente, eles são atormentados pelas frustrações e desesperanças que se acumulam nas várias mudanças que já passaram.
Debutando na direção, Paul Dano trás Zoe Kazan para ajudar no roteiro e, juntos, carregam a inspiração de onde se conheceram - o estilo de Jonathan Dayton e Valerie Faris, de Pequena Miss Sunshine e Ruby Sparks.
Se a estética de cores fortes e berrantes até emula o cinema da dupla supracitada, a autenticidade está no pulso e crueza da trama, que não busca a redenção fantasiosa para um clímax energizante, e sim a aceitação dolorosa do fim. A resignação de que a vida jamais será mestrada.
Nota 8.
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