Jurassic World: Domínio (2022) - Crítica

Como em Hollywood existir como entretenimento não é suficiente, é claro que mesmo um capítulo de Jurassic World tem algum comentário social a dizer. Não que o resto da franquia estivesse imune a isso, com suas discussões sobre complexo de Deus, mas agora a empreitada é mais contemporânea por parte de Trevorrow, que reassume o manto de diretor. Não há discrição em martelar inúmeras vezes, numa tentativa desesperada de soar profundo e engajado, a necessidade de coexistir, aqui expressa pelos dinossauros soltos pelo mundo desde "Fallen Kingdom", mas que tenta dialogar nesta nossa era de extremismos, a se destacar o político. 

É engraçado ver o longa tomar para si esse desafio de transmitir ensinamentos a se modificar de uma tendência moderna comportamental que tem nos levado a condições ruins, quando ele mesmo é um espécime colossal do que há de pior no cinema blockbuster americano hodierno. Sempre brinquei como Jurassic World era uma Marvel com dinossauros pela sua megalomania e necessidade de estímulos constantes em tela, frequentemente vazios, sem inspiração e artificiais. Isso faria ainda mais sentido com a chegada do trio original, tornando Domínio definitivamente mais um na onda "legado". Porém, neste terceiro capítulo, a saga atinge um nível ainda mais baixo: ao invés de Marvel, agora se tornou um Velozes e Furiosos com dinossauros.

Aliás, outra similaridade que ambas as franquias dividem, é essa decadência e mudança de tom ao andar dos longas, cada vez mais desalmados e megalomaníacos. Enquanto Jurassic Park começou como uma fantasia de suspense que soube trabalhar os dinossauros para realizar tanto uma história de monstro quanto sobre o encantamento que essas criaturas proporcionam, algo minimamente mantido na trilogia original, a fase World, iniciada já em pleno domínio (risos) da Marvel, sempre teve uma proposta diferente, e a escalação do "heroico" Pratt, em contraste com Sam Neill, evidencia isso. 

Não deixou de ser um problema em toda sua extensão como trilogia, salvo leves pitadas de horror, como o clímax de Fallem Kingdom (aí nas mãos de J.A. Bayona), essa esfera mirada para o que o público das massas está voltado hoje, quase que única e exclusivamente o que o faz sair de casa para os cinemas, e nem seria um problema caso o fosse através de boas ideias, afinal, nem todo filme da Marvel é um completo desperdício (só uns 90%). Porém, se primeiramente foi Steven Spielberg quem idealizou todo esse universo, um diretor conspícuo por seu talento e visão para dar vida à fantasia, a franquia World, por texto e direção, parece ter sido marcada mesmo pelo pastiche, algo adotado sem muito desdém, chegando no inacreditável fundo de poço em Domínio.

Há pouco ao elenco original fazer fora meramente carregar seu carisma superior e toda a bagagem sentimental das aventuras passadas, já um respiro do irritante e automático Owen de Pratt, ator qual a franquia se viu presa neste tempo entre a escalação do então superstar em ascensão, prestígio muito perdido durante esses anos através de um desgaste de imagem por suas escolhas políticas e papeis repetitivos na tela. No entanto, mesmo o trio clássico, em especial Neill e Dern, é posto em condições mais análogas ao ritmo contemporâneo de agir, e a divisão de núcleos não auxilia muito na cadência do filme e o desinteresse das subtramas da garota clonada e os gafanhotos laboratoriais, tudo um esquema empresarial maquiavélico, em contraste com o ingênuo Hammond do original, aí também retrato dessa metamorfose da visão pública à figura do empresário bilionário. 

Como gênero, resta pouco aos dinossauros como agentes de um cinema de heroísmo, golpes e perseguições ao estilo espionagem fora falharem em seus ataques e serem mero aparatos para manobras de automóveis ou golpes dos próprios humanos, em intermináveis sequências que extrapolam o ridículo e a falta de inspiração visual para a criação dos tão mencionados estímulos. É a síntese do blockbuster atual, que busca conquistar por excesso e não qualidade - e aí novamente Tom Cruise merece as palmas pelo seu excepcional Top Gun: Maverick, um milagre prático e no uso de nostalgia para se manter relevante e incrível neste mar de CGI e cinema sem autoria. 

A falta de encanto e amor com as criaturas, relegadas a monstros descartáveis (fora a mascote Blue, mas aqui de menor importância), é ilustrada pelo filtro escurecido do longa, outro legado do cinema blockbuster pós-2010, que esconde mesmo sua textura e cores, numa sabotagem aos próprios efeitos da película, normalmente um de seus pontos fortes. Nisto, as batalhas bestiais, que normalmente maravilhariam mesmo se filmadas no automático pela aparência das feras, são escondidas pelo seu couro enegrecido misturado à noite chuvosa, paisagem adotada para um clímax tão esquecível e indivisível quanto a trilogia, pelo menos nisto coerente. 

Jurassic World encerra como começou: um conceito mais imaginativo em pensamento que na prática. Funcional e rentável na multimídia mais por uma promessa do que nunca é e esse fascínio cultural pelas criaturas que não mitiga, tendo nenhum rival de alto orçamento para competir com suas criações, ainda que tente se sabotar até mesmo nisso, a mera exibição. No fim, Jurassic World é produto de seu tempo, no pior sentido: um longa cansativo e raquítico, fadado ao esquecimento, falho até mesmo como propulsor de nostalgia. 

3 comentários:

  1. "ao invés de Marvel, agora se tornou um Velozes e Furiosos com dinossauros"

    Pra mim isso não é ofensa kk Mas concordo com a crítica. Filme "decepcionante". O que me incomodou mais foi o desperdício de potencial, visto que elaboram uma premissa onde os dinossauros estão espalhados pelo mundo e a humanidade tenta conciliar... Para depois o filme adentrar mais uma vez um ambiente limitado, assim como a franquia cansou de fazer. O arco da garota clonada tem mais desenvolvimento que os dinos. E falando nos dinos, a impressão que tive foi que, quanto mais perigoso ele fosse, mais fácil de escapar da situação seria.

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    1. Elogio? haha. Eu gosto dos 3 primeiros e talvez do 5. Mas perdeu toda a essência. Nisso, são duas franquias similares mesmo. Perderam completamente o espírito que as fez boas em busca de um público maior. Até conseguiram mais grana, mas a troco de desastres narrativos.

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    2. Eu só não curti os últimos mesmo, anda bem desgastante. Pra salvar as franquias só se aquele rumor doido de um crossover entre os dois se concretizar kk Muito improvável, mas não duvido de nada. Pq inserir ciborgue, vírus apocaliptico, sorte/imortalidade e ida ao espaço não deu certo não. Só tacando um meteoro mesmo. Digo, dinossauros.

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