Obi-Wan Kenobi (2022) - Crítica

É engraçado notar como a mitologia de Star Wars foi e é, obviamente, a responsável por seu sucesso e legado cultural, mas também tende a ser sua ruína. A verdade é que os grandes conceitos da criação de George Lucas se assumiram como um elefante branco dentro do imaginário popular, já que independente do realizador que assuma o barco desde a compra da LucasFilms pela Disney, se veja refém não somente deste folclore, mas do fundamentalismo de fãs que desentendem as próprias intenções da franquia e seu mentor, visto a perseguição de Rian Johnson quando tentou mudar algo nesta cadeia autofágica. 

Um passo criativo exitoso, mas financeiramente ruidoso para o estúdio mais covarde e seguro de Hollywood. Acabou sendo, inclusive, uma boa desculpa para se manter acuado dentro de conceitos limitados de cultuação a nomes e figuras conhecidas. Tanto que mesmo Mandalorian, que acaba sendo uma rara unanimidade dentro e fora do fandom, se destaca pela boa trama um pouco afastada do núcleo principal, porém sem deixar de o reconhecer. Foi a saída possível encontrada por Favreau e Filoni. 

Obi-Wan, entretanto, não apresenta esse benefício, já que traz no próprio título a necessidade de se basear no arco principal que move a franquia e seus personagens mais queridos. Se ao mesmo tempo isso confere o peso de se adequar dentro de uma cronologia que já tem passado e futuro, entretanto, ao menos permite uma nova revisita do carismático mestre Jedi vivido por Ewan McGregor. Preencher o tempo e espaço do que aconteceu entre os episódios III e IV não deixa de ser uma tarefa curiosa, de potencial, mas o resultado acaba sendo como quase tudo da saga sob ordens da Disney: uma ode de tão somente nostalgia e timidez criativa, como se isso fosse suficiente para manter viva a marca.

Aliás, ao incluir Darth Vader, Leia e Luke na trama de Kenobi, além de reforçar essa prisão que Star Wars vive, a própria força narrativa então estabelecida do canon se enfraquece, visto que o peso do reencontro entre mestre e Padawan em Uma Nova Esperança perde intensidade. Porém, o que seria de Obi-Wan sem estas figuras emblemáticas? A resposta é um resultado desta covardia e falta de ideias ou liberdades para se contar histórias quando no mundo de Lucas, em vista que basicamente todos os valores da série se dão pela presença de personagens já conhecidos e amados, e não por acréscimos ou uma ampliação do universo em si. Diria até que seus legados acabam sendo essa merecida segunda chance a Hayden, que tanto sofreu, pessoalmente e artisticamente pela recepção dos prequels (ironicamente agora cultuados) e a novata Vivien Lyra Blair, que encarna a jovem Leia com uma vibração e autonomia que honram Carrie Fischer e carregam a série por sua química com McGregor. 

No entanto, o ritmo arrastado e enfadonho pra uma minissérie tão curta ressaltam uma falta do que fazer de fato com a série, esticando interminavelmente o que parece uma brincadeira de pega-pega pelas galáxias, apresentando o máximo possível de rostos, referências e cameos pelo caminho pra tentar agradar através disso, sem tempo ou interesse de explorá-los. O roteiro, majoritariamente pelas mãos de Joby Harold, parece até com medo do que aprofundar e incluir, sob alarme da parte fascista do fandom. Com um texto tão pobre e tão árido quanto as areias de Tatooine, a diretora Deborah Chow, que ganhou o posto aqui justamente por seu bom trabalho em Mandalorian e extenso currículo para TV, parece ter esquecido todo seu repertório. É como se o peso da marca (ou talvez o estúdio, rs) e o que carrega enxugasse talentos. 

São cinco episódios que beiram o constrangedor tanto nos diálogos quanto nas cenas de ação ou drama, tendo como ápice negativo as perseguições contra Leia dos capítulos iniciais, com um senso de urgência que rivaliza aos da Nickelodeon. Mesmo na dificuldade de criar alguma emergência retratando personagens que já sabemos o futuro, não deixa de ser um tanto quanto tedioso acompanhar as tentativas de criar tensão desleixadamente por Chow, deixando a experiência de acompanhar o que ocorre em tela ridícula e exaustiva com frequência, com o fim sendo uma benção e não lástima. 

Tudo para atingir uma certa redenção ao final, muito por conexões estabelecidas, quando é permitido sentir o peso do passado e a tragédia de alguns destinos sem uma leveza que parece obrigatória pela Disney, numa indecisão entre focar na brutal relação de Anakin e Obi-Wan e a culpa e desistência que levou o segundo a viver como um trabalhador braçal por anos e esquecer a força ou se manter aguado e inofensivo aos moldes da casa do Mickey. A troca da dinâmica entre o clima mortal de ambos e o mais alegre do Jedi com Leia suaviza a falta de equilíbrio no próprio tom da série. Mas é quando deixa de tentar interromper momentos íntimos com megalomanias ou piadas intromissivas ao estilo Marvel, que Obi-Wan recorda os melhores momentos da franquia original e consegue engrandecer seu panteão com cenas e diálogos memoráveis, que se dá especialmente no reencontro entre Darth e Kenobi, seguido também de um extasiante confronto de sabres de luz. 

Uma pena que só se tenha atingido isso no canto do cisne. Ainda que seja marcado por um pioneirismo do cinema blockbuster e no licenciamento de produtos, o sucesso desses campos só se deu por Star Wars conseguir criar interesse por eles na própria tela, através de sua história e desenvolvimento. E é tudo isso que parece faltar na franquia hoje. A Disney tenta manter a marca relevante e agradar seus fãs sem perceber que não são eles que a mantêm vive, mas sim a impedem de evoluir. 

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