Crítica - Sr. Holmes(2015).
Sr. Holmes(Mr. Holmes), dirigido por Bill Condon. |
Sherlock Holmes se tornou um ícone mundial. O famoso detetive, criado por Sir Arthur Conan Doyle, atravessou gerações e a evolução da mídia do entretenimento em si, tendo triunfado em todas elas. Muito mais do que um rosto de ator, o personagem tornou-se um nome - já vimos sua versão mais moderna, asiática, em desenho animado e como blockbuster americano. Agora, em 2015, chega "Sr. Holmes/Mr. Holmes", mostrando uma nova faceta desta lenda britânica.
Adaptação do livro Um Pequeno Truque da Mente, de Mitch Collins, o filme mostra Holmes(McKellen) como um senhor de 93 anos, aposentado e vivendo isolado no litoral, contando apenas com a companhia de uma caseira(Laura Linney) e seu filho, Roger(Milo Parker). O detetive enfrenta problemas sérios de memória enquanto tenta escrever um relato verídico de seu último caso, mas sem conseguir lembrar detalhes como o por que desta investigação ter sido sua última.
Para os fãs mais ávidos pelas histórias de Doyle, é necessário deixar claro que a proposta do longa passa muito longe de ser uma trama criminal. Apesar do uso constante de flashbacks que fornecem certo tom investigativo enquanto Holmes busca lembrar todos os fatos de seu trabalho final para compor o livro, estes possuem muito mais função dramática, tornando nós equivalentes ao protagonista, já que conhecemos sua história ao mesmo tempo em que o mesmo se redescobre. A familiar perspicácia está presente, mas o foco é em seus arrependimentos e pesares acumulados pela vida, um lado poucas vezes explorado na personalidade deste brilhante, porém frio detetive.
E nessa abordagem, a fita de Bill Condon(que já havia trabalhado com Ian em Deuses e Monstros) se sai muitíssimo bem. O Sherlock que conhecemos é cínico e brilhante, mostrando desprezo pela ficção e apreço por fatos e circunstâncias, até mesmo em situações extremas, como a de morte. Apesar de fascinante, esse fator sempre serviu mara mantê-lo longe de nós, meros sentimentalistas, algo que desprezava.
Aprendemos a amar o personagem mesmo com sua falta de humanidade aparente, e os motivos usados pelo mesmo para elucidar o porquê de agir assim são plausíveis e aceitáveis. Preterindo as emoções pela lógica, Sherlock sempre conseguiu se manter distante das pessoas que o contratavam, além de se manter calmo em situações de emergência, o que o possibilita raciocinar e bolar planos para superar as adversidades. Condon deixa bem claro como essa virtude pode ser benéfica em uma cena específica do filme, mas a meta principal do diretor, juntamente com Ian McKellen, é mostrar como a atitude de extrema algidez muitas vezes o prejudica.
Para isso, a composição do eterno Gandalf é essencial e de um esmero e versatilidade aplaudível. Quando representando 30 anos mais jovem, compõe o investigador como um homem completamente seguro de suas habilidades, tão confiante que beira a arrogância. Já transportado para o presente, o veterano ator(76 anos) conta com sua aparência para passar a fragilidade de alguém que não é mais sombra do que já foi, inconformado e impotente com a própria degradação, e através dos olhares, é possível ver sua angustia a não conseguir mais lembrar de nomes, palavras e principalmente, fatos de sua vida. Em toda sua existência, fora ele quem fornecia as respostas, e agora mal conseguia lembrar trivialidades do dia a dia.
Conforme o longa avança, sua decepção consigo mesmo por não conseguir recordar o resultado de sua última investigação apenas aumenta, chega até mesmo a desistir, tamanha dificuldade. O desespero para parar a deterioração de sua memória é tamanha, que abandona sua metodologia empírica para tentar buscar a cura através de ervas e produtos naturais. E no definhar do homem, que surge a importância dos personagens de Laura Linney(mais uma bela atuação dessa subestimada atriz) e Milo Parker(boa revelação).
Holmes e Roger. |
Sherlock sempre se considerou um solitário, mas pessoas ao seu redor eram uma constante, e uma a uma, todas suas relações se encerraram - Watson, Mycroft, Sra. Hudson, Lestrade, todos eles. Seu único contado agora é com a caseira e Roger. Apesar de não admitir, o ancião formou laços com estes, principalmente com o menino, o vendo não apenas como um discípulo, mas como amigo. Os dois trazem à tona a humildade de Holmes, e este apenas encontra paz enfim assumindo que sua maior qualidade fora também, seu maior erro, abdicando do sentimento humano para buscar a lógica em tudo, o que o tornou, ironicamente, cego a fatos tangíveis. Muitas vezes as pessoas que o procuravam não buscavam um cérebro, apenas compreensão.
Nostálgico e melancólico em toda sua composição, sensações ressaltadas pela sensível trilha sonora de Carter Burwell, Mr. Holmes é um tremendo estudo de personagem, não é a melhor amosta que temos desta figura lendária, mas certamente merece ser lembrado e aclamado pela nova visão que apresenta. Inteligência é sim, importante, mas somos pessoas, emocionais e frágeis, e é melhor ser cônscio disso.
Nota: 7.
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