Halloween Kills: O Terror Continua (2021) - Crítica


Halloween Kills, cujo subtítulo desnecessário e tosco segue uma tradição legítima da franquia em solo nacional, não hesita em se assumir como um filme sobre medo. Porém, ele demora para estabelecer sobre qual medo se aplica. É um filme que surge em um contexto que já prejudica sua mensagem, explicitamente a mais política (a primeira?) da série, quando o lançamento claramente pretendia entrar em jogo no meio da polarização intensa das eleições americanas. 

Fato é que o zeitgeist do cinema hollywoodiano dos últimos anos não passou incólume ao Governo Trump, nem nenhum gênero, finalmente chegando a hora em que até Halloween se torna um verbete cinematográfico sobre a cultura que cercou - e, claramente, continuará sendo, portanto, de suas consequências e causas - o crescimento da extrema-direita, o que também não deixa de ser um retrato internacional. 

O longa tem como núcleo os traumas que Michael deixou na pequena Haddonfield, uma acanhada e naturalmente pacata cidade colocada no mapa pelas atrocidades do serial killer. Fato é de que, ao ignorar tudo que aconteceu entre o original de 78 e a sequência de 2018, Michael perde o misticismo que envolveu até mesmo um culto para explicar sua aparente sobrenaturalidade, assim como a quantidade de mortes, já que no primeiro, muito contido, a criação do mito através do suspense supera a plasticidade e contagem de corpos. A expressão de Carpenter sempre foi através do estilo e da atmosfera, e a contradição que seguiu em toda as continuações acéfalas não escapam dessa nova trilogia, que surgiu com pompa e um marketing "maduro", destacando sobriedade e o soturno das décadas que, como diz um personagem, "infestaram" os habitantes de Haddonfield. 

Porém, se na fita de 2018, já sem criatividade e muitas ideias narrativas fora a exibição de sanguinolencia - o que o aproxima muito mais das malsucedidas e baratas sequências do que o original, logo contradizendo as terem ignorado como se taxando todo o material como descartável - de David Gordon Green, um cineasta erigido na comédia, havia algum senso de intimidade pela relação mais próxima e quasi-espiritual entre Michael e Laurie, aqui o escopo é mais abrangente.

E então voltamos ao comentário no primeiro parágrafo da crítica, sobre o medo. É uma espécie de ironia, pois se claramente do meio pro fim fica bem expositiva a analogia central da obra sobre uma sociedade volatizada pela crescente da extrema-direita e todas as expressões análogas à ideologia, principalmente a cultura do ódio que potencializa os atos inconsequentes e violentos na nação, logo espelham tanto a banalidade do mal de Hannah Arendt quanto o experimento da prisão de Stanford, em que as resoluções mais lacônicas não seriam outras que não a perversidade intrínseca do homem, sem essa de nascer bom e ser corrompido pela sociedade. Myers, nisto, é um cidadão puro que não escondeu jamais sua verdadeira natureza, e sim representa o epítome da verdadeira face humana que, por conta dele, entra em ebulição sísmica até ser vazada pelos habitantes locais, numa rampante de ódio que dispensa racionalidades, somente a avidez por canalizar toda aquela energia negativa em um denominador comum, e azar dele ser inocente. O medo é do próprio homem comum, não to "diferente". 

O filme fazer essa comparação entre Michael e os habitantes como similares de certo modo é indicativo de suas "metáforas", e no final é evidenciado o tom supranatural dele (novamente, algo já arranhado no sexto longa, o que corrobora a falta de senso em se ignorar tudo) como um canalizador do ódio daquelas pessoas, como se Michael se movesse e recebesse combustível do rancor e malevolência em si daqueles que estão ao seu redor. Nesta leitura, é quase como se ele fosse uma vítima desse contexto. "Um criança num corpo de adulto com a mente de um animal", ele é descrito, o que parece querer lhe dar um álibi para tudo. 


A maior contradição de um filme cheio delas, entretanto, é a maneira como o diretor e sua equipe resolvem dar vazão a essas ideias narrativas, que nada mais soam do que esquetes episódicas (e por vezes amadoras) que fetichizam a morte e buscam extrair reações através de assassinatos pictóricos e gore - sem, entretanto, encontrar um estilo atraente para isso, nem conseguir construir um clima de suspense convincente ou evitar a sensação óbvia de que Michael aparecerá naquele momento, naquele lugar. Assim, tendo como principal expressão artística a exibição da morte como meio de entretenimento, o filme somente faz parte desta cultura de ódio que se recarrega através da desgraça. 

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