Indiana Jones e a Relíquia do Destino (2023) - Crítica


Se tem algo que nunca falhou na franquia Indiana Jones, são as cenas de abertura, iniciando já num fôlego para capturar a atenção imediata do público e transmitir o espírito de seu personagem. Mesmo no fraco Caveira de Cristal, o prólogo se sustenta bem isoladamente, transmitindo uma sensação empolgante que vai se dissolvendo conforme a narrativa progride. Pois bem, quando nem este clássico elemento convence, temos um problema. E isto, infelizmente, acontece em Relíquia do Destino, não exatamente por falta de ideias ou pela trama, mas especialmente pelo artifício do rejuvenescimento digital em Harrison Ford, oferecendo o estranhamento como a primeira impressão que temos deste Indy sem Spielberg. 

Eu não acredito que a primeira impressão seja a que fica, mas não é exatamente algo rápido, e sim de vinte ou trinta minutos na companhia daquele Indiana Jones parecendo um gráfico de game moderno. E se, como supracitado, estas introduções servem para revelar o espírito do longa, temos um filtro escurecido para esconder a ação e personagens vilanescos caricatos e de pouco aprofundamento. 

Trazer um novo nome para franquias prestigiadas é sempre uma jogada arriscada. Afinal, o que irá se sobrepor, o desejo por provação ou o receio por macular algo já estabelecido na cultura pop? Mangold é um diretor competente, mas com uma imaginação contida, ou então limitada de acordo com o estúdio ou o texto em que trabalha. A própria ação da introdução, aliás, não se restringe somente pela baixa iluminação e seus efeitos, mas na repetição do conceito - isto mesmo, no singular -, um pouco do pior do blockbuster burocrático. Lembra bastante os recentes Jurassic Worlds, apostando em desgastantes e longas perseguições sem criar um set piece desafiador e imaginativo de fato, algo elementar no sucesso da franquia de Spielberg e Lucas, sempre preenchida de sacadas inteligentes para complementar a ação em improviso. 

Indiana Jones nunca foi uma franquia de complexidade, mirabolância ou megalomania, mas sim da genialidade em trazer o lúdico extremo através da simplicidade das tramas com uma engenhosidade prática fenomenal e o charme incalculável de Ford. E o ator envelhecido é uma figura muito mais reconfortante e magnética do que uma variação desalmada sua, por mais que seja necessária na trama que se buscou. O peso do tempo num Indy amargurado, personalidade tão distante da que víamos antes, só quebrada num momento de empolgação durante suas aulas, é reflexo tanto da mensagem sobre tempo que a obra discorre a seguir, quanto da própria apatia e cinismo do mundo em si, ainda que se passe nos anos 50. 

Na era da nostalgia, Mangold até evita se apoiar demais nisto, mas tampouco incute alguma nova identidade na franquia, deixando um misto morno de apatia e melancolia, que acaba convencendo mais nas interações sarcásticas de Ford e Waller-Bridge do que de fato na ação, o que por si só arrasta o ritmo do filme e suas incessantes e prolongadas sequências climáticas, uma questão sombria para um filme que tanto se baseia neste gênero. Perseguições em carros, a pé, de barcos. É um grande pega-pega , esquemático e previsível, entre o grupo dos anti-heróis e dos nazistas, em que a charlatã de Bridge e o amargurado Jones vão se afeiçoando aos olhos do público. Ao passo que Mikkelsen é mais uma vez subutilizado em Hollywood num personagem de papel, preguiçoso e manhoso, com capangas brutamontes tão desinteressantes quanto. 

Indiana Jones surgiu para satisfazer a vontade de Spielberg em dirigir um 007, no que Lucas o tranquilizou em ter algo muito melhor. Primeiro com Shia e agora com Phoebe, os produtores parecem querer imitar outro elemento da saga de Bond, que é a renovação para ter um nome, não um rosto. Mas se vimos algo em Caveira de Cristal e em Relíquia do Destino, a resposta para este objetivo é a mesma de enfrentar o tempo que vimos neste longa: impossível. Indiana Jones é Harrison Ford. Um dos personagens mais icônicos do cinema, imortalizados pela personificação despojada e sedutora do lendário ator. Resta aceitar e respeitar seu adeus sem manchar mais seu legado. 

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