Jogador Nº 1 (2018) - Crítica

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Se você resolver montar uma lista com os 20 filmes mais marcantes que assistiu, dificilmente não haverá alguma fita de Steven Spielberg lá. Do mesmo modo, se organizar outra seleção com os que mais lhe divertiram, é capaz de haver mais de uma produção de Steven (se nasceu no século passado, inevitável). Entretanto, é bem provável, também, que o longa escolhido seja datado de décadas atrás; algum capítulo da trilogia Indiana Jones, Jurassic Park, ET, Tubarão. São muitos os clássicos do referendado cineasta.

Neste século, o diretor, responsável pela criação do primeiro blockbuster de fato, se distanciou dos espetáculos que lhe tornaram referência na indústria. Como ele mesmo disse em entrevista recente, o envelhecer lhe trouxe novas prioridades, históricas e sociais, deixando para trás o esquema de se colocar na cadeira do espectador para entregar algo "popular". Nos últimos invernos, percebeu-se uma aproximação tímida com sua face mais "meninoide", em As Aventuras de Tintim e O Bom Gigante Amigo. Mas foram esforços decepcionantes vindos de seu histórico. Sem pioneirismo ou força para atemporalidade.

Jogador Número Um, adaptado do livro homônimo de Ernest Cline, então, surge como cobertor nostálgico para o diretor, simbolicamente ideal para alguém culturalmente moldado nos anos 80, apegado à nostalgias, mas não obsoleto e estagnado.

Situado num 2044 distópico, o saudosismo é regado na infertilidade e decadência duma sociedade amontoada e cinzenta, vivendo enclausurada e cercada de poeira e sucata numa urbanização desenfreada que beirou a destruição do planeta, numa era em que as pessoas se contentam em sobreviver ao invés de resolver os problemas, como resume Wade Watts, o protagonista vivido por Tye Sheridan com competência. A realidade perde a disputa com o OASIS, software criado por Ogden Morrow (Simon Pegg) e Halliday (Mark Rylance) que funciona como uma comunidade dos sonhos, originalmente orquestrado como um jogo e que permite aos usuários moldarem avatares e adquirirem itens para as mais diferentes funções, e que convenientemente passou a substituir tarefas cotidianas básicas e de subsistência.

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Mesmo que o livro estabeleça as referências, a transposição de mídias e o peso trazido por seu nome, deram a Spielberg e sua equipe a carta branca para abusarem da imaginação em como e quais figuras da cultura pop introduzir para compor o universo, limitados apenas pelo obscuro quintal de direitos autorais, o que certamente anulou participações de gostos "molhados" escritos por Cline. Apesar da atraente ideia fazer tudo parecer fácil, a dificuldade surge exatamente neste contexto, da necessidade de se atingir um equilíbrio, controlar a excitação e não deixar tudo como uma fanfic fetichista em que a quantidade de referências importa mais do que sua utilidade narrativa. Tarefa bem manejada.

Claro, é legal vermos figuras, rostos e logos conhecidos apenas pelo prazer narcisista de saber do que se trata, uma ampliação colossal da sensação ao vermos Stan Lee em películas Marvel. O olho é frenético em encontrar personagens reconhecíveis em tela, visto que sua escala permite dezenas de figurantes e objetos ao fundo da ação principal, deixando várias aparições batidas, além de rimas visuais para os mais atentos (sendo minha favorita a que liga o Gigante de Ferro de Brad Bird com Gollum, de O Senhor dos Anéis).

A experiência de Steven é eficaz em apaziguar ansiedades sem tresloucar na avidez de enfiar referências in loco. Inclusive, ele dosa sua própria homenagem, escolha humilde se considerarmos citações a si no livro são de adoração. O T-rex está lá, é verdade, assim como outras reminiscências de obras comandadas ou produzidas pelo criador do Tubarão, mas sem destaque indevido.

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O maravilhamento sempre será decorrido da bagagem pessoal de cada espectador, o quanto do que vemos é familiar e, principalmente, experimentado. Fruto de sua época e intenção, é claro que filhos dos 80s, gamers em destaque, são os mais felizardos. Porém, o roteiro de Zack Penn e do próprio Ernest se rende à modernidade e fisga o público jovem, típico de blockbusters, com figuras contemporâneas.

O maior segredo e mérito deste time não reside, entretanto, nas referências, e sim em outra dinâmica, que envolve a introdução destas em contribuição ao andamento da trama. Mesmo que não seja um enredo complexo, estruturado e resolvido em esquemas já genéricos - aí talvez uma herança não intencional de décadas perdidas -, os artifícios Pops enfeitam os detalhes de outro modo comuns para sobressair nossa passagem pelo mundinho em tela, filmado com confiança por Spielberg, que entrega momentos alucinantes e distintos, ora uma corrida megalomaníaca, ora numa improvável batalha nipônica entre um Gundam e um bem articulado MechaGodzilla. Cenas interligadas, não esqueçamos, pela jornada que busca salvar aquela imersão das mãos compulsórias do capitalismo predatório e elitista da IOI, monopólio que busca monetizar o OASIS, idealizado como plataforma livre e inclusiva, a entupindo de propagandas e métodos pay to win tão recorrentes em mmos. Entre os atores de carne e osso, relegados à coadjuvação de seus próprios egos virtuais, brilha Olivia Cook, revelada na série Bates Motel, e que enche Art3mis de vibração, autonomia e camadas de personalidade.


Já se não pôde contar com seu parceiro habitual, John Williams, na trilha sonora, Steven fez questão de chamar outro velho parceiro, Alan Silvestri (da trilogia De Volta Para o Futuro), que emula bem as harmonias que consagraram Williams justamente nos anos 80, por vezes parecendo insertos fieis a Contatos Imediatos e ET.

Sem jamais abdicar de sua vertente otimista, Spielberg ainda consegue incutir a jornada de Waden e seus amigos com os moralismos já típicos de sua filmografia, em especial os minutos finais, brindando o público com o que, diz a história da indústria, este mais quer, que é um final feliz e esperançoso, por mais cínicos que sejam nossos tempos.

É uma mensagem honesta e calorosa, por vezes eclipsa pelo brilhantismo com que o OASIS é recriado, evidentemente mais interessante que o mundo real - o nosso e o fictício -, mas palpável e que, sabemos, e por isto mesmo dói mais, é verídica, o que joga um tom quase documental ao longa, em que poderemos ver, em breve, nossa própria sociedade um bando de sobreviventes despreocupados em resolver sua situação.

Nota 8.

3 comentários:

  1. Tava querendo ver, mas o cinema daqui preferiu estrear Nada a Perder.

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  2. Nem me dei ao trabalho de pesquisar quem é a distribuidora do filme, mas está fazendo um lançamento pesado, em inúmeras salas e diversos horários, tentando pegar o mesmo público dos 10 Mandamentos, mas pelo que tenho acompanhado, tá flopando, com ingressos superinflacionados pela própria empresa.

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  3. Na verdade sou muito fã de ver filmes de ação, eu adorei Jogador Nº 1. A história é muito boa e original. Eu amo assistir filmes de ação, é meu gênero favorito, de todos os filmes que estrearam em 2018, este foi o meu preferido! Tye Sheridan esta impecável no filme. Ele sempre surpreende com os seus papeis, pois se mete de cabeça nas suas atuações e contagia profundamente a todos com as suas emoções, sigo muito os filmes de ação novos, sempre me deixa impressionada em cada nova produção. É uma boa opção para uma tarde de filmes, sem dúvida o veria novamente.

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