Your Lie in April (2016) - Crítica


A alcunha negativa carregada por adaptações live-action de animes é compreensível, apesar de discutivelmente injusta quando consideramos as dezenas de obras produzidas neste nicho. Infelizmente, é claro, justamente os longas de maior visibilidade são os de conteúdo mais pavoroso, como Dragon Ball Evolution e Death Note, filmes tão catastróficos que jogam a cruz para todos seus companheiros.

Porém, se a grande massa costuma tomar conhecimento, majoritariamente, de adaptações de shounens, devido ao natural alcance mais abrangente das temáticas de entretenimento fulgurante, tanto aqui quanto no próprio Japão, há um mercado ativo e prolífico de menor repercussão no que tange a transferir as mídias de séries televisivas a fitas com atores reais. Em gamas opostas, a falta de notoriedade contribui também para a menor expectativa e hype generalizado, no próprio cenário nipônico, com bilheterias mornas e que se conformam com o público similar aos respectivos anime e mangá.

Assim, timidamente, quase que percebidos somente por quem vive neste pequeno terreno dos shoujos, já tivemos versões em carne e osso de Kimi ni Todoke, Orange, Ore Monogatari, Ao Haru Ride, Lovely Complex e dezenas de outros. Além, é claro, do assunto deste post, o celebrado Shigatsu Wa Kimi no Uso.

O melodrama de Arima Kosei e Kaori, assim como outros do gênero, encontra o privilégio de não carecer de suntuosos efeitos para validar seu universo, ao contrário de basicamente qualquer shounen, visto que as histórias sempre envolvem as desventuras amorosas de um casal principal e, vez ou outra, selecionados coadjuvantes. Porém, um fator que abrilhanta a trajetória dos dois por seus desencontros costumeiramente enrolados e reticentes, é a música envolvida, um grande motivo de seu sucesso, já que ele serve de palanque para o desenvolvimento do convívio entre Kaori e Kosei, além de oferecer momentos de puro deleite e catarse aos fãs de música clássica.


A reutilização deste elemento, no live-action em nada deve ao anime, sendo surpreendente a dinâmica e verossimilhança que o diretor Takehiko Shinjo conseguiu empregar nas apresentações de violino e piano, cujo papel na trama é imprescindível e qualquer desconforto em sua execução arruinaria o conjunto. Muito disso se deve ao esforço de Suzu Hirose e Kento Yamazaki, que iniciaram a prática dos instrumentos seis meses antes das filmagens. Mesmo sendo impossível que tenham adquirido tamanha agilidade e destreza para tocarem todas as peças usadas no longa, nenhuma discrepância ou artificialidade é transmitida por sua atuação tanto física quanto emocional enquanto carregam os instrumentos, principalmente Hirose, que dá vida à expressiva e radiante Kaori, com seu modo rebelde e transgressor de tocar.

O grande esquema de Shigatsu, no entanto, não está na sua trilha sonora, mas em como esta é inserida no desenvolvimento dos personagens, despistando sobre seu enredo (quase) sempre previsível, limitado e bastante cafona. Quando você assiste o primeiro Shoujo, talvez se emocione. No segundo, persegue semelhanças, mas talvez seja coincidência. No terceiro, fica óbvio que se trata de um padrão consolidado, uma grande fábrica de fanservices destinados a um público feminino, mas que também encontra reflexo em indivíduos masculinos mais sensíveis, apaixonados ou apenas delirantes para pavonear seus fetiches.

Aí me encontro numa área frequentemente traiçoeira a quem assistiu ao anime antes do filme, pois é uma desvantagem já entrar com conhecimento do roteiro, o que, muita vezes, de forma inconsciente, complementa informações omitidas - falhas - da nova mídia. Como assisti a animação há anos, não posso afirmar se é caso de maturação ou deficiência, mas além das lacunas do material original, há um contraponto crasso no filme de Shigatsu, que é a deficiência humanitária de seus habitantes, algo não desculpável pelo tempo enxuto em comparação ao disponível para adaptação.


Não é um erro exclusivo, visto que muitas vezes estas histórias se balizam em arquétipos redondos e manjados de cavaleiros e damas, que muito raramente não envolvem traumas passados, equívocos em lidar um com o outro, desfortúnios no amor crescente, um terceiro elemento e, finalmente, uma tragédia final. Fique tranquilo, me aterei de entregar quais destas características estão aqui presentes, mas são sintomas de repetição, que fadigam o expectador não fanático mais familiarizado com o estilo.

Kousei e Kaori são o centro da atenção de modo que pouco se vale sequer mencionar os outros seres, e mesmo no foco absoluto, falta profundidade em seus conflitos. Se Suzu ao menos confere carisma e sua invejável beleza para simpatizarmos com a talentosa garota, Kousei, o protagonista maior por expor seu ponto de vista a tudo, excede na unidimensionalidade de sua apatia onipresente, pouco explicável somente pelo passado conturbado, parecendo até sintomas de alguma condição psicológica maior, como o Asperger.

Culpa que não cabe somente ao ator Kento Yamazaki, visto que pouco material lhe é oferecido para trabalhar. O estudante transita passivamente por sua vida, obedecendo rapidamente aos outros e aceitando suas debilidades até que alguém lhe ofereça uma resolução.

Sim, existem histórias que andam a despeito ou por causa de seu personagem - os estudos de personagem. Shigatsu, como live-action, entretanto, perde o tom da introspecção e a torna somente vazia, distante do mar revolto de emoções que costuma habitar o interior dos silenciosos.

Your Lie in April, na tradução americana aderida na publicação do mangá em território brasileiro, pela Panini, é como dar o mais caro violino a um aluno medíocre: ele vai tentar, alguma coisa pode soar bacana, falhas podem passar despercebidas a leigos. Mas faltou muito para ficar, de fato, memorável.

Nota 6. 

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