As Melhores Animações da Década: 2011-2020

Teoricamente, seria incorreto dizer que meu gênero de cinema favorito é o de animação, pois animações, ao contrário do que se diz por aí, não compõem um gênero, mas sim um estilo de narrativa, neste caso, cinematográfico. Assim como documentários, são um tipo técnico que pode compreender vários gêneros dentro de sua duração. E essa é somente uma das maravilhas provocadas pelo método animado, meu favorito, relevando todas as possibilidades da sétima arte. Considerando o papel catártico da arte em nos fazer sentir, emocionar, chorar, refletir e tudo mais, eu acho que o potencial máximo só é igualado pela liberdade natural das animações, das mais infantis, às mais adultas.

Nisto, inauguro as listas de melhores desta década que está acabando justamente com meu ranking top 10 das melhores animações deste último decênio, compreendendo os anos de 2011-2020, com breves comentários.

Vamos lá!

10º Song of The Sea


O Cartoon Saloon, estúdio de animação irlandesa, entrou no radar dos cinéfilos em 2009, com "Uma Viagem ao Mundo das Fadas", num estilo de animação 2D feito a mão, mas só atingiu seu ápice em 2014, com "Song of The Sea", utilizando de uma temática similar ao explorar o folclore gaélico e introduzi-lo para enriquecer uma fábula introspectiva sobre o amadurecer de crianças. Muitos estúdios mundo afora tentam quebrar o monopólio do 3D americano, e enquanto a melhor referência de resistência sempre será o Ghibli - e, sem sair do Tio Sam, o Laika -, na Europa, ninguém desponta com a maestria do Saloon, principalmente os projetos idealizados por Tomm Moore. 

É uma boa mescla entre a contemplação aventuresca do Ghibli, com a cultura Irlandesa e Escocesa, o que certamente resulta numa experiência enriquecedora ao público que busca explorar novos caminhos sensoriais e cognitivos. 

09º Ernest & Célestine

Se pensarmos nas animações como uma narrativa de potencial infinito para contar histórias para todos os públicos, capazes de interessar e divertir do mais novo ao mais velho dos seres, o francês Ernest & Célestine é um dos melhores exemplares para ilustrar o argumento. A obra, silenciosa e num lindíssimo tom de aquarela, o que garante uma atmosfera bastante melancólica para o filme, usa de dois animais carismáticos e antropomorfizados para contar uma história de papéis sociais e como construções culturais moldam os preconceitos dos cidadãos, por mais que, intrinsecamente, não tenhamos razão nenhuma para o ódio. Apesar de otimista, não deixa de ser uma constatação realista e triste do modus operandi social, bastante análogo ao clássico subestimado da Disney, O Cão e a Raposa. 

08º Como Treinar o Seu Dragão 2


Quando discutimos sobre o papel de animações e à mente surge uma ideia infantilizada, completamente equivocada e desrespeitosa, ela se deve ao modo como alguns realizadores usam o gênero. E a Dreamworks, fora espasmos bem esporádicos, é dos principais motivos para esta abrangência. O Estúdio, criado para rivalizar com a Pixar e Disney, usou das mesmas sinopses dos concorrentes e as infantilizou de um modo bárbaro nos primeiros anos, até estabelecer a própria marca, e hoje em dia, no geral, parece ter se conformado a esse papel. Se Shrek era maduro, suas sequências tiveram uma regressão intelectual catastrófica, e um dos poucos que se salvaram nesta rotina, foram os filmes da trilogia do Dragão, todos dirigidos por Dean DeBlois. 

Vencedor moral do Oscar de animação de 2015 (ou alguém ainda prefere Big Hero 6?), Como Treinar o Seu Dragão 2 engrandece e inova a introdução esplendorosa do seu capítulo inicial em todas as vertentes, sem medo de evoluir e desafiar os personagens, nem discutir temáticas controversas e que somente engatinham nos grandes estúdios americanos. O nível foi tanto, que tornou inevitável a decepção com o encerrar da trilogia, por mais satisfatório que tenha sido. 

A esmeralda, entretanto, será sempre o meio da saga de Soluço e Banguela, desde então uma das figuras mais adoradas e fofas da cultura pop, isso sem perder o significado nem apelar para um abestamento da trama. 


07º
Vidas ao Vento

Todos estamos felizes que Miyazaki está realizando um canto do cisne seminal para daqui sei lá quantos anos, mas e que pérola de despedida seria The Wind Rises. Uma história de paixão e de terror, acima de tudo uma constatação da ambiguidade humana em criar beleza e originar destruição a partir dela. O filme, neste aspecto, o mais pessoal e passivo do cineasta, é algo bastante próximo ao desenvolvido por seu parceiro Isao Takahata em sua célebre carreira. 

06º Anomalisa

Charlie Kaufman provando que um bom realizador é, acima de qualquer restrição, um bom realizador. Assim como Wes Anderson, o diretor migrou para um novo estilo sem perder sua essência nem se extraviar nas novas possibilidades da escola, e sim amplificou ou explorou novas camadas possíveis da quebra de realidade em sua obra de terapia; profunda, mas extremamente niilista e, consequentemente, depressiva. Uma experiência difícil, mas que nos detalhes revela seu brilhantismo. 

05º A Tartaruga Vermelha

Coprodução francesa com o Ghibli, o debut na tela grande do diretor de curtas, Michael Dudok de Wit, é uma das melhores amostras puras de arte sensorial da década, em que não há grande razão para nada fora a existência em sua totalidade contemplativa e primitiva - questionavelmente idealizada, mas ainda bela. 

04º Divertida Mente


Peter Docter é um diretor de filmografia perfeita. No começo, os louros iam a Lasseter; depois, a Andrew Stanton. Hoje, vejo como unânime e irrefutável a convicção na supremacia intelectual e sensitiva de Docter no time criativo da Pixar. Monstros S.A, Up e Divertida Mente são todos, talvez, top 5 da Pixar, uma regularidade talvez evolutiva em questões existenciais e emotivas acima até do aspecto técnico. Talvez, ele pudesse entrar outra vez na lista com Soul, a ser lançado no Natal. A Pixar passou por uma década difícil e mais desértica que seu normal, mas não por causa de Peter, sua principal esfera espiritual. 

03º Frozen

Certamente o meu favorito da lista, Frozen é um filme que sofre até hoje por saturação. E é compreensível. Let it Go foi um marco na indústria, mas atualmente, poderia facilmente ser a trilha sonora do inferno, e os rostos de Anna e, principalmente, Elsa (que tomou para si o título de A Frozen) se tornaram tão onipresentes em produtos para crianças, como figurinhas, objetos de decoração e festas, que é natural se ter uma antipatia por elas. 

Porém, deve-se abstrair qualquer rancor (menos se você for um pai ou mãe, talvez), pois a adaptação livre do conto da Princesa da Neve é o primeiro grande marco da Disney neste século, e obviamente seu grande expoente na mudança de ares do estúdio, alavancando a carreira da diretora, Jennifer Lee, hoje chefe criativa do setor de animação da Disney, numa trajetória espelhada às adoráveis protagonistas, símbolos de uma nova geração de garotas que domam seu destino.

Mas não é somente na militância que se encontra a força de Frozen, e sim, principalmente, na harmonização dessa atualidade social com a dimensão de seu encanto, uma magia tocante e sensibilizadora que estava sumida do estúdio desde a laureada Renascença. 

Se o marketing de Frozen passou dos limites, o filme segue lá, num pedestal merecido e inalcançável. 

O Conto da Princesa Kaguya

Hayao Miyazaki se tornou sinônimo do Ghibli mundialmente, mas a idade, por mais que idolatre e ache o diretor de Mononoke Hime e Chihiro um gênio absoluto, me fez ver com predileção a filmografia de outro criador do estúdio, menos celebrado, mas igualmente transcendental na arte de fazer filmes - Isao Takahata. Suas obras são menos fantásticas e mais humanistas, pelo menos as melhores, mas não por isso deixam de pegar o lado fabuloso e lúdico da vida, mesmo que seja como um escapismo da tragédia. O Túmulo dos Vagalumes e Into Yesterday são obras monumentais, e se Pompoko e Yamadas são trabalhos competentes, mas discretos, Isao fez de Kaguya o potencial melhor último filme de uma carreira da história, uma despedida sublime de alguém que, quando parecia não ter mais energias de produzir uma masterpiece - Hayao chegou a chamá-lo de preguiçoso -, entregou uma ode ao imaginário e ao feminino de uma beleza e delicadeza inigualáveis na vasta e debochada lista de filmes da casa de Totoro. 

Como se soubesse se tratar de sua última assinatura, Isao não economizou, fazendo da obra a mais cara do estúdio, mas deixando um legado final não somente para evidenciar o potencial ilimitado da animação, como um grito de socorro e apoio às mulheres, sem fazer nenhum alarde, algo louvável considerando se tratar de um senhor na terceira idade em meio à sociedade conservadora japonesa. 

Inventivo e estonteante, Kaguya revitaliza o conto e, sem menosprezar suas particularidades temporais, o torna contemporâneo de modo simples, mas grandioso. 

01º Spiderverse

Se muito se discute sobre a morte do cinema blockbuster com a banalização do super-heroísmo e a mimetização de estruturas inofensivas e pré-programas em tramas que parecem feitas por algoritmos, onde não importa se o protagonista é um monstro ou um jovem atormentado, de alguma forma haverá um vilão e uma narrativa similar ao que vemos na Marvel, ou mais escurecidamente, na DC, Spiderverse chegou já no final da década novamente para cravar a bandeira da animação como um conspícuo estandarte da criatividade, aliando representatividade com uma narrativa única e generosa com o material de origem. Uma criação de inspiração incomparável na Hollywood atual. 

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Menções honrosas: Toy Story 4, Frozen 2, Night is Short Walk on Girl, Viva, A Silent Voice, Wolf Children, Minha Vida de Abobrinha, Kizumonogatari (trilogia), Kubo, Ilha dos Cachorros, Moana, Zootopia, The Big Bad Fox & Other Tales.

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E é isso, meus queridos e idas. Espero que tenham curtido, e que a próxima década nos brinde com mais incontáveis brilhantes produtos dessa técnica tão admirável de arte. E não esqueça de também deixar suas dicas abaixo.

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