“Há décadas em que nada acontece, e semanas em que décadas acontecem" disse Lênin, mas esse decênio que se encerra ao fim de 2020 (sim, não teimem com a matemática e história, ejaculadores precoces que comemoraram o novo século em 2000 e agora querem seguir persistindo na insistência estética equivocada nas décadas) devidamente revolucionou a mídia do audiovisual - não entrando no mérito se mais positiva ou negativamente -, tendo como pá de cal um ano maldito que forçadamente instituiu mudanças na indústria que talvez prevaleçam para sempre, modificando as estruturas desse sistema secular e autofágico. Os blockbusters com quase 100% das salas 100% do tempo, a hiperexposição dos longas de heróis, inclusive transitando os gêneros, a estagnação da animação 3D, mas principalmente, os meios de consumo do que chamamos de cinema, com o advento e consolidação do streaming como substituto da televisão e até do cinema entre o público convencional, agora inclusive na inclusão simultânea de filmes de grande clamor popular, como os lançamentos de Mulan, Mulher-Maravilha 1984 e Soul.
Independente dos meios, dos novos nomes surgindo e dos gêneros em voga, muito filme bom continuou a ser feito ao redor do mundo, infelizmente nem sempre com a atenção necessária. E se 2020 trouxe mais mudanças tecnológicas de distribuição que técnicas, tivemos outros 9 anos "normais" para dificultar a escolha de somente 20 filmes para o top do ranking entre os milhares lançados nesse período.
Não sou tão bom em estabelecer listas. As posições nunca parecem adequadas e sempre sinto ter esquecido de algo, assim como, nas próximas horas, dias, semanas e anos, provavelmente irei, sempre que olhá-la, chegar numa conclusão diferente de quem deveria estar na lista no lugar de outro filme, ou sua ordem. Como exercício, então, que fique claro que eu acho todos os 20 filmes a seguir sensacionais, alguns obras-primas seminais para o estudo do que a sétima arte traz de melhor.
Vamos lá, em ordem decrescente!
20 Evangelion: 3.0 You Can (Not) Redo (2012) - Hideaki Anno
Se um dos principais males de remakes e reboots é o medo de desapegar do material original, Hideaki Anno descontruiu completamente grande parte dos conceitos de sua magnum opus em Evangelion neste 3º capítulo dos filmes. Se o longa inicial foi análogo aos primeiros episódios do anime, mais tradicionais e capciosos, as sequências reverberaram e chacoalharam as estruturas da franquia, introduzindo novos personagens e amplificando o amálgama referencial da obra. Se o encerramento da saga será satisfatório após uma construção tão ambiciosa e complexa, não sei, mas a estrada até aqui faz jus à marca.
19 Midsommar: o Mal Não Espera a Noite (2019) - Ari Aster
Uma das experiências mais satisfatórias com um filme, é quando ele cresce conosco com o tempo. Uma amostra inicial se expande conforme pensamos sobre a obra. Midsommar foi assim comigo. Na
lista dos melhores do ano passado, ficou em 4º, e agora, aparece no ranking da década, ao contrário de dois dos longas que o superaram naquela ocasião.
"O exercício presente de assisti-lo é espetacular. Jamais previsível e óbvio, cada novo frame, descoberta, é um choque, e não somente pelo visual, e sim no conceitual, dando nova vida ao folk horror, mas jamais se contentando em ser uma homenagem, e sim uma nova referência no gênero.
Apesar do ridículo subtítulo, a ambientação diurna do longa catapulta bem o trabalho magistral do diretor e sua equipe, não somente em aspectos técnicos, mas ao tirar a essência do horror fora do estereótipo deste, através de ações, ou ainda mais, da ignorância que temos, juntamente aos personagens, do que acontece no local, em uma trama de crescente paranoia e senso de perseguição que gruda conosco como se estivéssemos naquele pequeno vilarejo sueco. Sufocante e poderoso."
18 Divertida Mente (2015) - Pete Docter
A Pixar teve uma década instável, bem diferente da dominância no setor, durante a década anterior. Várias sequências (ou prequels) fracos e originais esquecíveis. O poço de criatividade parecia ter secado. Menos com Viva, mas principalmente, Inside Out (e espero que Soul adentre esta seleta lista, em breve), que carrega todo o brilhantismo narrativo do estúdio com esmero em como lida com temas delicados de forma madura, sensível e tocante. Já é um marco na indústria e no estilo.
17 Samsara (2011) - Ron Fricke
Samsara; no hindu, o nome do processo de metempsicose humana; isto é, reencarnação, em pessoas, animais ou vegetais. Ron Fricke dá sequência a seu trabalho estonteante em Baraka e Chronos através de uma linda meditação sobre o universo. É complicado discutir um filmes desses. Assistam ao
trailer.
16 Um Alguém Apaixonado (2012) - Abbas Kiarostami
Abrangesse 2010, essa lista seria bem diferente. I Saw The Devil, Kick-ass e Scott Pilgrim com certeza estaria em alguma posição. Mas também Certified Copy. Porém, data não é problema para o saudoso Abbas Kiarostami, que deixou outra obra-prima somente dois anos depois, com Someone in Love, passaporte japonês do diretor em sua peregrinação mundial, abraçando com afinco uma das principais característica do cinema introspectivo nipônico: a solidão.
15 John Wick (2014) - Chad Stahelski, David Leitch
Por mais esboçadas, coreografadas e trabalhas que sejam as sequências de John Wick em sua carpintaria estrutural, acredito que jamais chegarão ao nível de grandiosidade minimalista do primeiro longa, justamente pelos fatores que hoje são inalcançáveis pelas midiáticas continuações: os malabarismos do baixo orçamento, que deram todo o senso estético de melancolia e mistério ao sombrio mundo de Wick, perfeitamente personificado na figura moribunda e carismática de Keanu Reeves, que usou bem do papel para alavancar uma carreira em decadência. Inspirados nos longas de ação do leste-asiático, os diretores surpreenderam o Ocidente com uma competência que mesmo coreanos e japoneses não têm conseguido igualar nos últimos anos.
14 Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016) - Barry Jenkins
Entre as tantas histórias negras que Hollywood nos presentou nesta década "Woke", alguns excelentes, como 12 Anos de Escravidão, Fruitvale Station, Corra!, Selma, Infiltrado na Klan, Django, entre outros, Moonlight erige como um dos destaques do também excelente 2016, que nos reservou filmaços como A Criada, A Bruxa, Capitão Fantástico e O Lamento, ao trabalhar o saturado gênero do coming of age com delicadeza e seriedade, mas também de forma bruta e realista dentro do nicho retratado.
13 Paddington 2 (2017) - Paul King
Se o Paddington acha, eu concordo;
Se o Paddington fala, eu escuto;
Se o Paddington erra, eu perdoo;
Se o Paddington pensa, eu admiro;
Se o Paddington tem dez fãs, eu sou um deles;
Se o Paddington tem um fã, eu sou esse fã;
Se o Paddington não tem fãs, eu não existo.
É isso. Filme mais puro do século. Assisti-lo é como Anton Ego, quando come o Ratatouille de Remy.
12 A Caça (2012) - Thomas Vinterberg
Passada a baboseira narcisista e inviável do Dogma 95, tanto Lars quanto Thomas entregaram trabalhos mais preciosos e significativos aderindo a tudo que o cinema oferece de verdade. E o principal projeto de Vinterberg foi em 2012, sua primeira parceria com Mads Mikkelsen, em "A Caça", numa atuação esplendorosa sobre a a derrocada de um jovial e sorridente professor que é acusado de abuso sexual pela filha de um amigo. Um assunto delicado tocado de maneira ousada pelo cineasta, que de forma crua e acusatória, critica a cultura de ódio e julgamento da sociedade. Isto tudo antes de termos nossa era do cancelamento.
11 Frozen (2013) - Chris Buck, Jennifer Lee
"Certamente o meu favorito da lista, Frozen é um filme que sofre até hoje por saturação. E é compreensível. Let it Go foi um marco na indústria, mas atualmente, poderia facilmente ser a trilha sonora do inferno, e os rostos de Anna e, principalmente, Elsa (que tomou para si o título de A Frozen) se tornaram tão onipresentes em produtos para crianças, como figurinhas, objetos de decoração e festas, que é natural se ter uma antipatia por elas.
Porém, deve-se abstrair qualquer rancor (menos se você for um pai ou mãe, talvez), pois a adaptação livre do conto da Princesa da Neve é o primeiro grande marco da Disney neste século, e obviamente seu grande expoente na mudança de ares do estúdio, alavancando a carreira da diretora, Jennifer Lee, hoje chefe criativa do setor de animação da Disney, numa trajetória espelhada às adoráveis protagonistas, símbolos de uma nova geração de garotas que domam seu destino.
Mas não é somente na militância que se encontra a força de Frozen, e sim, principalmente, na harmonização dessa atualidade social com a dimensão de seu encanto, uma magia tocante e sensibilizadora que estava sumida do estúdio desde a laureada Renascença.
Se o marketing de Frozen passou dos limites, o filme segue lá, num pedestal merecido e inalcançável. "
10 O Lamento (2016) - Na Hong-jin
"É por casos como este que o cinema do leste-asiático (principalmente Coreia e Japão) é meu favorito. O orçamento é menor, o que dobra os esforços por criatividade pura e simplista. O Lamento é a antípoda de si mesmo; é tudo e nada; é céu e inferno; é branco e preto. Se penso nos melhores do gênero, me chegam a mente "Memórias de um Assassino" e "Oldboy". São duas obras-primas difíceis de rivalizar. O Lamento consegue, pois também é uma obra-prima. Utilizando do Sobrenatural em sua essência, que atemoriza mundanos pela incredulidade perante a existência do inexplicável, o diretor Na Hong-jin entrega o que provavelmente será seu esforço da vida. Rótulo de: queria esquecer para me maravilhar novamente pela primeira vez. Um filme sobre o estado puro do mal. Foi pros favoritos."
09 Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) (2014) - Alejandro González Iñárritu
Sim, Inarritu é um baita de um egocêntrico e nada justifica isso. Mas para mim, é também um marrento genial, em todos seus filmes que assisti. Se a melhor parte de sua filmografia, ainda quando em terreno caseiro, ficou na década passada, ele teve grande desempenho nessa década, com duas merecidas estatuetas de melhor diretor, uma por Birdman, que também levou o melhor filme (e eu votaria nele aquele ano).
Um filme tecnicamente inteligente, e mesmo que não seja necessária a montagem "sem cortes" fora um exercício de ego, não deixa de ser bacana e muito bem usada para conferir verossimilhança, fluidez e imersão naquele universo debochado e irônico que discute o papel da crítica e dos estigmas dentro de Hollywood. Um humor ácido e esperto, com uma das melhores atuações de elenco nesta década.
08 O Mestre (2012) - Paul Thomas Anderson
Talvez o melhor diretor americano em atividade, Paul Thomas Anderson possui filmografia distribuída, até então, em três diferentes décadas, e em todas elas, há pelo menos um filme seu no top 10 dos melhores. Sem perder fôlego, energia ou criatividade com o tempo, o cineasta faz o que melhor um autor poderia buscar para si e ao público, que é se reinventar e procurar novos meios de executar seu talento e transmitir suas ideias. Sempre avesso ao ortodoxo e previsível, seu melhor esforço nesta década foi em "O Mestre", que superficialmente fala sobre a criação da enigmática e infame cientologia, mas que traz sua riqueza justamente na inteligência das subcamadas, em que discute aspectos da natureza humana que leva à criação de cassinos religiões, mas também a subserviência de quem adere a elas.. O trio de atores principal está espetacular, e Phoenix merecia mais o Oscar aqui que por Coringa.
07 O Ato de Matar/ O Peso do Silêncio (2012/2013) - Joshua Oppenheimer
A premiada dupla de documentários do cineasta Joshua Oppenheimer escancara um dos maiores massacres do último século, acontecido na Indonésia em 1965 (pelos militares, acredita nisso? rs), que levou a vida de mais de meio milhão de civis. Os documentários foram fomentadores para que em 2016, o genocídio fosse finalmente
reconhecido em corte. Isso significa que foram, entretanto, 5 décadas de esquecimento e ostracismo, como todo grande conflito sem o interesse dos americanos ou algum atrativo aos grandes países Ocidentais (alguém lembrou de Ruanda?). O Reino Unido, os EUA e Austrália foram inclusive considerados cúmplices do caso. Nisto, os documentários de Joshua foram gravados num país em negação de sua própria história, cujos assassinos ainda ocupavam cargos de poder, impunes e "radiantes". Não sei bem o que o diretor disse quando aportou no país com a câmera, mas o resultado é um dos maiores estudos antropológicos e psicológicos do cinema. Joshua filma passivamente e dá toda a liberdade, tanto para vítimas, mas também para os agressores, contarem como tudo aconteceu. E o choque não vem exatamente do relato de quem perdeu a família ou amigos, mas sim dos próprios violentadores, que livremente e com orgulho, reencenam a própria brutalidade, como matavam, estupravam e perseguiam. Uma dessas obras que esvazia mesmo a mais repugnante ficção de significado, pois na realidade se encontram as mais tenebrosas histórias de terror.
"É como se Hitler tivesse ganhado a guerra e Himmler fosse um herói nacional, salvador da pátria. Na Indonésia, os ganhadores seguem tendo muito poder e toda a impunidade do mundo para seguir perpetuando sua versão dos fatos", disse Joshua.
06 Guerra Fria (2018) - Paweł Pawlikowski
O cinema do leste Europeu se destaca há algumas décadas, especialmente após o fim da União Soviética, pela especialidade em filmes frios e cínicos, por mais humanas que sejam as representações em tela. Com Ida e agora Cold War, Paweł Pawlikowski se tornou um mestre nisso, porém, aperfeiçoando a reversão emocional ao se restringir exposivitismo e sentimentalismo em excesso, com personagens enfrentando, neste caso, uma Guerra Fria muito mais introvertida que externa, mas sempre camuflando tudo com posturas elegantes e distantes. É bastante dolorido de se assistir, mas cinema não é somente sobre se sentir bem, não é?!
05 Em Chamas (2018) - Lee Chang-dong
Produção sul-coreana baseada em conto do japonês Haruki Murakami, Burning fez sucesso por onde passou, construindo uma fama crescente desde seu debut, em Cannes.
Dirigido pelo Chang-dong Lee, uma espécie de Terrence Malick asiático, Burning é como uma longa e reflexiva poesia, que confere ao mundo uma beleza cruel e ímpar, esfolando suas injustiças em nossa impotência de resolvê-las, podendo apenas contemplar, inertes, enquanto as horas jamais cessam de passar, ignorando todas nossas dores e desejos. Um retrato da insignificância humana.
04 O Conto da Princesa Kaguya (2013) - Isao Takahata
"Hayao Miyazaki se tornou sinônimo do Ghibli mundialmente, mas a idade, por mais que idolatre e ache o diretor de Mononoke Hime e Chihiro um gênio absoluto, me fez ver com predileção a filmografia de outro criador do estúdio, menos celebrado, mas igualmente transcendental na arte de fazer filmes - Isao Takahata. Suas obras são menos fantásticas e mais humanistas, pelo menos as melhores, mas não por isso deixam de pegar o lado fabuloso e lúdico da vida, mesmo que seja como um escapismo da tragédia. O Túmulo dos Vagalumes e Into Yesterday são obras monumentais, e se Pompoko e Yamadas são trabalhos competentes, mas discretos, Isao fez de Kaguya o potencial melhor último filme de uma carreira da história, uma despedida sublime de alguém que, quando parecia não ter mais energias de produzir uma masterpiece - Hayao chegou a chamá-lo de preguiçoso -, entregou uma ode ao imaginário e ao feminino de uma beleza e delicadeza inigualáveis na vasta e debochada lista de filmes da casa de Totoro.
Como se soubesse se tratar de sua última assinatura, Isao não economizou, fazendo da obra a mais cara do estúdio, mas deixando um legado final não somente para evidenciar o potencial ilimitado da animação, como um grito de socorro e apoio às mulheres, sem fazer nenhum alarde, algo louvável considerando se tratar de um senhor na terceira idade em meio à sociedade conservadora japonesa.
Inventivo e estonteante, Kaguya revitaliza o conto e, sem menosprezar suas particularidades temporais, o torna contemporâneo de modo simples, mas grandioso."
03 Homem-Aranha no Aranhaverso (2018) - Peter Ramsey, Rodney Rothman, Bob Persichetti
"Se muito se discute sobre a morte do cinema blockbuster com a banalização do super-heroísmo e a mimetização de estruturas inofensivas e pré-programas em tramas que parecem feitas por algoritmos, onde não importa se o protagonista é um monstro ou um jovem atormentado, de alguma forma haverá um vilão e uma narrativa similar ao que vemos na Marvel, ou mais escurecidamente, na DC, Spiderverse chegou já no final da década novamente para cravar a bandeira da animação como um conspícuo estandarte da criatividade, aliando representatividade com uma narrativa única e generosa com o material de origem. Uma criação de inspiração incomparável na Hollywood atual."
02 A Bruxa (2015) - Robert Eggers
Ari Aster e Robert Eggers, que dupla que revitalizou e engrandeceu o gênero terror nessa década. Cada um com dois filmes, todos excelentes. Eu prefiro a dupleta de Aster, mas o meu predileto de todos, é A Bruxa, um dos maiores debuts da história do cinema. O folk horror de Eggers (gênero de Midsommar, de Aster, que abre essa lista) me atormenta e perturba até hoje, numa sequência de pesadelos que evidenciam nossa defasagem como seres, e extrai prazer através do horror disso. Um dos trabalhos mais viscerais e abençoados da década, e também um dos maiores de todos os tempos.
01 Parasita (2019) - Bong Joon-ho
"Na minha lista dos filmes favoritos da vida, as primeiras cinco posições são tomadas por excelentes obras, afinal, as que mais gosto, mas cobertos de nostalgia, pois em sou um grande saudosista. A sexta colocação, entretanto, é de um longa coreano que só conferi depois de já me considerar cinéfilo. E do sétimo ao décimo, novamente, há outros grandes filmes, mas cujo principal referencial está na época que os vi, de modo que talvez não estivessem ali se os tivesse conhecido somente depois de mais maduro.
Assim, em um critério racional e técnico, posso dizer que meu sexto filme favorito de todos os tempos é, de certo modo, meu filme favorito de todos os tempos, e ele é Memórias de um Assassinato, de Bong Joon Ho, sujeito de aparência simples, voz baixa e tímida, mas que por trás das câmeras, mostra ser uma força da natureza selvagem e imparável.
Bong é o que chamamos de um autor, alguém que não somente dirige filmes, mas também os escreve, tomando controle total do que coloca seu nome como realizador. O resultado é uma carreira surreal e, simplesmente, perfeita. Arriscado e versátil, Bong não se contenta somente em contar histórias, mas sim em transformá-las em retratos e espelhos de nossos tempos. O cinema é, afinal, político, e o maior manifesto de um artista é sua obra.
Numa era de efervescente desigualdade social, em que líderes de alguns dos maiores países do mundo se mostram coniventes com a supressão dos mais pobres e estimulam o regime predatório do capitalismo em prol dos próprios ganhos, Bong cria a obra-prima global e até aqui, absoluta, apesar de focada em seu país, a Coreia do Sul, sobre o tema.
O mais maravilhoso de Bong é como sua inteligência anda interligada com seu grande humor, deixando Parasite ser uma experiencia muito além de uma crítica social, mas sim uma sátira da classe burguesa, suas mesquinharias e os famosos white people problems, ressaltando através de sutilezas elegantes como planos sobrepostos da chuva que cai através da enorme janela horizontal da casa dos ricos, mas causa uma enchente na família pobre dos protagonistas. O longa provoca o espectador e o acusa, provocando risos iniciais, até o ponto em que a ferida é exposta e se torna desconfortável até olhar e fazer parte daquilo.
Bong é um dos maiores diretores vivos, e Kang-ho Song, que encabeça o elenco, um ator que não deve nada a ninguém, e é ótimo ver um cinema reflexivo, consciente, mas também divertido e integrado com a realidade, falado em um idioma tao diferente, fazer o enorme barulho que Parasite fez. O cinema da Coreia do Sul está entre os melhores do mundo, e merece mais atenção."
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E é isso, meus queridos. Muitos filmes ficaram de fora e, reitero, é provável que a cada vez que eu reveja esta lista, pense em outro longa que poderia preenchê-la. Mas todos os presentes são, sem dúvida, enormes e preciosos. Não irei comentar sobre outras películas para não correr o risco de ser ainda mais injusto. No entanto, peço que deixem seus tops e recomendações abaixo.
Feliz Natal, Feliz Ano Novo, e uma nova década de belos filmes para nós!
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